Minha melhor marca – Doação de Orgãos

Para toda criança que inicia uma prática esportiva e é apaixonada por esportes, uma competição mundial ou Olimpíadas é um sonho. Para elas, estar próximo de super-atletas ou ser um deles é algo para poucas.

Sou Rodrigo Machado, 45 anos, transplantado de medula óssea e apaixonado por esportes. Na adolescência fui atleta de natação, e apesar de não ser da elite, e muito menos ter disputado uma competição a nível nacional, posso dizer que ganhei muito mais com a natação do que as poucas medalhas que ainda tenho de recordação.

Após encerrar a curta carreira nas piscinas, passei pouco mais de 20 anos praticando esportes, mas apenas para recreação e qualidade de vida, eis que em novembro/2012, meses após realizar um sonho de correr uma meia maratona, fui diagnosticado com leucemia e em poucos meses de tratamento quimioterápico e com a maravilhosa notícia que minha única irmã, Renata Machado, era compatível, fui submetido em abril/2013 ao transplante de medula óssea.

Durante todos os três longos períodos de internações para os ciclos de quimioterapia e transplante, sempre fiz com muita vontade o meu “dever de casa”; 1. Acreditar e ter fé; 2. Alimentação; 3. Atividade física, que pra mim, são os pilares para o sucesso em um tratamento.

Gradativamente em 2014, voltei a intensificar meus treinos na corrida e em agosto/2015 outra meia maratona. Não contava que em janeiro/2016 teria uma recaída, e um novo câncer sanguíneo. Dessa vez, por incrível que pareça, o tratamento foi muito mais complexo e fiquei muito mais debilitado, com três ininterruptos meses de internação para os ciclos de quimioterapia. Aos poucos fui melhorando até que em abril/2016 antes mesmo da alta, já fazia bicicleta ergométrica no quarto do hospital.

O tratamento continuou e continua até hoje, e em fevereiro/2017 no ambulatório do hospital em um procedimento de infusão de células da minha irmã, descobri a existência dos JOGOS MUNDIAIS DOS TRANSPLANTADOS, e o que era inimaginável, começou a se tornar possível. No mês de abril/2017, fui autorizado pela minha médica, Dra. Maria Cristina Macedo, a registrar minha inscrição e buscar uma piscina para iniciar os treinos para participar das Olimpíadas dos Transplantados.

De acordo com o Barão Pierre de Coubertin, idealizador das Olimpíadas da Era Moderna, “O importante é competir”. Os WORLD TRANSPLANT GAMES tem o espírito de celebração da vida, uma grande confraternização, mas tem uma competição por trás da festa e competir e ser competitivo, isto é, estar disputando com chances de conquistar algo é melhor ainda. Por isso fiz um levantamento dos recordes e dos medalhistas das últimas edições em todas as provas da minha categoria e com base nisso na minha primeira semana de treinos, estabeleci uma meta bem arrojada de tempos, #minhamelhormarca , para as provas. Um grande desafio!

Mesmo longe das piscinas há quase 8 anos e com uma lesão pré-existente no ombro, tinha apenas 8 semanas para reencontrar a natação e estar bem preparado para a competição. Dedicação e superação, com uma rotina de 5 treinos semanais, em média 2500 metros diários em 1 hora e 20 minutos de piscina, apenas 1 falta para realizar um procedimento do tratamento, e sessões diárias de fortalecimento muscular com elástico, alongamento e abdominais. Além disso, duas vezes na semana, sessões de acupuntura e fisioterapia para amenizar o desconforto e dores físicas e preservar/recuperar a lesão no ombro.

Como não tínhamos tempo, a estratégia do Walter Rodrigues, meu técnico, foi usar as 4 primeiras semanas para um trabalho de base (técnica e resistência), 3 semanas com aumento gradativo em séries (tempo/velocidade) e a última semana para polimento. Infelizmente só foi possível corrigir pequenos detalhes na técnica, minimizar os erros mais crônicos e vícios de nado e potencializar ao máximo os pontos fortes.

Num piscar de olhos já era junho e estava em Málaga na Espanha para disputar 5 provas da natação nos WTG. Conheci e me tornei amigo de transplantados que mesmo sem saber, me motivaram todos os dias naquelas 8 semanas, todas as vezes que eu lia os tempos e nomes deles antes de cair na água. Graças a Deus, e todos os treinos bem realizados, fiz o meu melhor e consegui #minhamelhormarca , superando as metas de tempos estabelecidas no início de maio. Mesmo os Jogos tendo o seu melhor índice técnico de todas as 21 edições já realizadas, consegui conquistar 2 medalhas de ouro nos 200 medley (com novo recorde mundial da categoria) e 100 livre, além de mais 3 medalhas de prata nos 50 e 100 costas e 200 livre, retornando ao Brasil com 5 medalhas no total. Superar os tempos e ainda ganhar medalhas, alegria em dobro.

Fazendo uma analogia com o início do texto, nos WORLD TRANSPLANT GAMES, estive lado a lado com super homens e super mulheres, transplantados que a cada dia superam mais um obstáculo em busca de uma vida saudável e normal. Poder após algumas adversidades relacionadas à saúde, que poderiam me privar da prática de esportes e até da própria vida, estar apto para participar dos WTG Málaga 2017 foi mais uma das grandes vitórias e recompensas da minha vida. Outro sonho realizado!

Que venha 2018 e os Transplant Games of America (USA) e também os Juegos Latino-americanos para Deportistas Trasplantados (Argentina), preparatórios para o próximo WTG Newcastle/Inglaterra 2019.

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